Meu inferno sexual
Mariano*, mesmo transando 20 vezes por dia, queria mais.
Por Sergio Crusco

'Deixei de comprar comida para gastar com prostitutas'Mariano*, 39 anos, funcionário público Eu era muito pequeno, mas lembro de uma babá ter me molestado sexualmente. Tinha uns 3 anos, fui morar com meus bisavós e essa moça, uma espécie de governanta, era quem me dava banho. Ela pedia para ver meu pênis, perguntava se estava duro e o introduzia em sua vagina. Não lembro das cenas claramente, nem sei se alguém de casa chegou a desconfiar do que acontecia. Eu simplesmente não sabia o que estava acontecendo, o que era aquilo, e também não sei até que ponto essa experiência influenciou minha vida sexual adulta.
Fui uma criança solitária e sem amigos. Minhas diversões eram gibis, revistas de futebol e masturbação. Me masturbava compulsivamente, mais de 20 vezes por dia, até o colchão ficar encharcado de suor. Foi assim até os 15 anos, quando um amigo me levou a um passeio pela avenida do Estado, em São Paulo, e pela primeira vez fiz sexo com uma prostituta. A partir dali, todo dinheiro que conseguia gastava com programas.
Aos 20 anos, me casei. Fui um marido fiel, porque era feliz com ela. Isso não quer dizer que minha compulsão diminuiu. Fazíamos sexo várias vezes por dia, todos os dias. Chegamos a transar 20 vezes num dia só. Ela sabia que era fora do comum, mas não reclamava, porque queria muito engravidar. E tivemos um filho. Mas o casamento se desgastou e chegou ao fim.
Solteiro de novo, aos 27 anos, voltei às garotas de programa -todos os dias. Procurava mulheres em boates e em anúncios de revistas de encontros. Queria experimentar louras, morenas, negras, índias, altas, baixas. Nunca fui dado a fetiches específicos, sadomasoquismo ou coisa parecida. Minha grande fantasia era estar com o maior número de mulheres que pudesse. Estabelecia uma 'meta'e a perseguia: 'Hoje quero uma negra de seios avantajados, hoje quero uma oriental, hoje quero uma mulher que tenha pêlos nas pernas'. Nesse período viajei três vezes para a Europa -França, Holanda, Itália, Inglaterra, Bélgica. Tinha interesse em conhecer outras culturas, mas era inevitável procurar experiências sexuais em cada nova cidade. Tinha a fantasia de transar com uma mulher numa vitrine de Amsterdã. Realizei. Era fascinado por mulheres louras de olhos azuis, o que me levou à Dinamarca.
Minha situação financeira ia de mal a pior. Além das viagens, gastava tudo o que ganhava com prostitutas, em São Paulo. Quando ficava sem grana, pedia emprestado a amigos ou recorria a financeiras. Cheguei a ficar sem comprar comida: não me importava com o que comer, só pensava em sexo. No trabalho, conseguia cumprir minhas obrigações, mas passava o tempo todo pensando no final do expediente, como alguém que espera ansiosamente a happy hour para tomar uma cerveja com os amigos.
Quando ficava um dia sem transar, tinha crises de abstinência: suava, sentia dores no corpo. Uma vez, até desmaiei no trabalho. Ficava indisposto, perdia a capacidade de raciocínio. Eram sintomas parecidos com os de quem tem dependência química, embora não fosse o caso. Nunca usei drogas e sempre bebi moderadamente. Uma dessas crises durou 20 dias. Eu estava totalmente sem dinheiro, absurdamente endividado com três financeiras e com vários conhecidos. Quis vender um vale-transporte de dez unidades para um colega de trabalho. Ele sabia que eu vivia atrás de prostitutas e disse que não compraria o passe, pois, mais do que de dinheiro, eu precisava de ajuda.
Até aquele dia, eu achava que podia continuar vivendo daquele jeito, mas a conversa com esse colega foi um alerta. Senti que aquela loucura por sexo não era mesmo normal. Já havia lido uma reportagem sobre o Dasa [Dependentes de Amor e Sexo Anônimos] numa revista. Procurei os telefones e, no dia seguinte, fui à primeira reunião. Ali, encontrei homens e mulheres com histórias como a minha, e percebi que era mesmo doente por sexo.
Isso foi em outubro de 1999. São quase dez anos de Dasa, porque o processo de recuperação foi lento. Comecei a a seguir a programação dos 12 passos, que é parecida com a dos Alcoólicos Anônimos. Eles ficam um dia sem beber, a gente fica um dia sem sexo, e assim por diante. Durante o tratamento, comecei a me interessar pelas mulheres de um jeito mais normal, não só pensando em sexo. Nessa fase, fiz dois testes de HIV e, felizmente, não contraí o vírus, apesar de ter praticado sexo sem proteção algumas vezes. Na época, achava que, se contraísse o vírus, era só procurar mulheres que também fossem positivas. Na verdade, acreditava que minha vida já estava perdida.
Há cinco anos, conheci minha atual companheira, numa rotisserie perto de casa. Trocamos telefones e começamos a namorar. Com ela, tenho uma vida sexual equilibrada, sem dependência, sem obrigações. Não faço mais sexo para tentar preencher um vazio. Ela conhece a minha história e, até pelo fato de ser psicóloga, entende os problemas que enfrentei. Aos poucos, sanei minhas dívidas, e descobri prazeres que havia deixado de lado ou nunca havia experimentado. Coisas simples, como viajar, ir ao cinema, ouvir música, fazer caminhadas com minha mulher ou simplesmente estar entre amigos.'
ONDE PROCURAR AJUDA:
DASA (Dependentes de Amor e Sexo Anônimos)
-http://www.slaa.org.br/-, o site informa os endereços e horários de reuniões da irmandade em vários Estados do Brasil. PROAD (Programa de Orientação e Atendimento a Dependentes) -(11) 5579-1543, http://www.proad.unifesp.br/
* Os nomes foram trocados a pedido dos entrevistados
Foto: Cristiano
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